
O PIOR JÁ PASSOU
Essa semana li uma bela
crônica do Karnal sobre uma prisioneira de Auschwitz que apesar de tudo amava a
vida e acreditava na humanidade. Deve ser horrível a pessoa ser privada da sua
liberdade individual, ter sua dignidade destruída e ser obrigada a fazer o que
não quer como abandonar seu lar para ser torturada e morta num campo de
concentração. Depois que a 2° Guerra Mundial acabou o mundo pode ter uma dimensão
das atrocidades cometidas durante sua vigência pelos nazistas que ambicionavam
dominar o mundo e colonizá-lo. Muita coisa mudou, graças a Deus. A ONU foi
criada com a missão de manter a paz entre os povos, a declaração dos Direitos
humanos foi elaborada e as Constituições tornaram-se o coração normativo
jurídico e politico das nações.
A humanidade se
humanizou após a 2° Guerra Mundial, por assim dizer. Desenvolvemos sistemas e
teorias para garantir nossos direitos e liberdades fundamentais. Segundo a professora
de Teoria geral do processo penal da PUC- Minas Aline Nahass “A liberdade é um bem indisponível,
irrenunciável e inderrogável e não pode ser violada a não ser que aja uma
justificativa para isso. E que justificativa seria essa? Sentença penal condenatória
transita em julgado.
A
liberdade é um direito fundamental. É um dos atributos da nossa condição
humana. Portanto, também um direito personalíssimo. Não tem como dissociar a
liberdade da nossa esfera individual de direitos e garantias fundamentais. Nós
temos liberdade. Excepcionalmente nós podemos ser privados dela.
Não
é porque a pessoa não esteja sofrendo alguma agressão física que ela não está
sendo submetida a um tratamento desumano, cruel e degradante, que não ela não
esteja sendo submetida à tortura. O texto constitucional não faz qualquer
diferenciação entre tortura física e tortura psicológica. A Constituição proíbe
que se imponha a quem quer que seja um tratamento desumano, cruel e degradante
ou que configure tortura.”
Não podemos negar o
Holocausto assim como não podemos negar nosso holocausto pessoal, quando ele
existe, nem podemos negar o holocausto prisional brasileiro. Por exemplo, em
certos casos a prisão provisória é levada a efeito com o único objetivo de
forçar alguém a fazer um acordo de deleção premiada. Nesse aspecto vários
princípios que integram a tipologia do direito penal são violados, como o in dubio
pro réu e o direito de não produzir provas contra si mesmo. Ora, não é esse
tipo de sistema processual inquisitório chantagista que desejamos num estado
democrático de Direito.
Em nossa vida humana há
muitos guetos. Por exemplo, o gueto milenar das mulheres objetificadas e
oprimidas por um mundo machista! Recentemente uma onda de protestos contra o
assédio e o abuso sexual e emocional que elas sempre sofreram na indústria
cinematográfica e na vida social como um todo foi deflagrada. Diretores e
atores de Hollywood foram expostos e denunciados. As mulheres, prisioneiras de
sua condição feminina, decidiram por um fim, não aos abusos, porque não depende
apenas delas, mas ao silêncio que sequestrava qualquer chance de libertação em
face aos seus opressores. É uma lição de coragem e emancipação que deve ser
louvada e reproduzida.
Como disse recentemente
para alguém muito importante para mim “O pior já passou”. O pior era quando elas
sofriam abuso sexual e emocional e ninguém ficava sabendo (ou simulavam que não
sabiam ou eram coniventes com os abusos) e elas ainda tinham que fingir que
estava tudo bem, que estavam felizes, o que constitui uma dupla violência
contra elas. Agora elas podem recomeçar e reconstruir sua autoestima. Não são
mais prisioneiras invisíveis de um campo de concentração social. Podem escolher
como irão viver suas vidas e com quem. Podem exigir e exercer seus direitos
humanos básicos. Time’s Up (acabou o tempo) da tortura psicológica e do
desrespeito cínico e cruel. As mulheres assumem a responsabilidade pela sua
própria vida e não se arrependem.
Um novo tempo surge em
nosso horizonte. Um tempo de respeito e de liberdade.
Por: Thiago Castilho
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