"O meu olhar azul como o céu
É calmo como a água ao sol.
É assim, azul e calmo,
Porque não interroga nem se espanta ..." Fernando Pessoa
quarta-feira, 14 de julho de 2010
OLHOS DE RESSACA
Cena do histórico filme "Curtindo a Vida Adoidado." Dizem as línguas "impuras" do Pitágoras que um professor de direito penal nosso era dublê do ator americano Matthew Broderick. No último dia de aula insinuei-lhe o boato. Ele ignorou a provocação. Então, deixei pra lá. Ainda é cedo para confrontar promotores
Uma ressaca pode ser uma experiência de dimensão metafísica ou mesmo espiritual. Uma ressaca pode mudar a sua vida, atualizar seus conceitos, enfim, torná-lo um ser humano melhor. Ou talvez não. Tudo depende de você. Não é assim que ensinam todos os livros de auto-ajuda? Eu já li alguns, embora negue sorrindo. Por exemplo, as 48 Leis do Poder ou A Bíblia do Mal como o alcunhei. Outro, Os Sete Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes (muito bom) e um talvez dois Paulo Coelho em toda minha miserável existência. Embora não tenha tido apetite para concluir a leitura do exotérico O Diário de Um Mago, eu gostei de 11 Minutos. (Por que só 11 minutos?). Nunca esquecerei uma frase sua: “No meu quinto orgasmo encontrei a Deus.”. O livro narra a história de uma pobre mulher brasileira vítima do trafico de mulheres, coagida a se prostituir na Europa, nunca, entretanto, apesar de seus inúmeros clientes, tinha tido um orgasmo, coitada. Quando se apaixona por um homem pela primeira vez e faz amor com ele tem logo 5. Chamemos isso de super-recuperação do prazer. Contudo este post não é sobre livros de auto-ajuda (embora tenha ficado a dica para a leitura de três.) nem sobre sexo com ou sem amor, eu sinto muito. Este post é sobre a maldita ressaca. Vamos a ela. Talvez seja essa a melhor vantagem do casamento.
“A angústia é a minha ressaca, quando bebo a vida demais!” Rosa Berg
"Meu mundo é tão cheio de arte, idéias malucas e conversas profundas que às vezes eu me esqueço que a maioria das pessoas não tem acesso a isso. E me sinto uma alienígena num mundo medíocre. Ainda bem que eu encontrei você. Eu tenho morado no seu blog." Fernanda Machado, desabafando comigo
Sábado. 15h00min. Um exército de homens invade minha casa. Que zona é essa, perguntei para minha mãe, intrigado. “Eles vão fazer a despedida de solteiro do Bruno no terraço aqui de casa.” Ela respondeu. Eu tinha me esquecido desse evento marcado. A título de informação: Bruno é um nosso amigo da família mui querido, rapaz bom, marcado para se casar aos 25 anos e nada tem a ver com o Flamengo, maria-chuteiras, seqüestro, tortura, assassinato e esquartejamento. Enfim, a despedida de solteiro do Bruno foi o máximo. Ele desceu pessoalmente para me intimar a comparecer (como se precisasse): “Vamos, Dr., só ta faltando você.” Fui ao clube do bolinha. Segundo minha escritora viva favorita, Izabela Boscov, a integridade da camaradagem entre homens é “um admirável traço masculino que uma vez enraizado resiste a total falta de afinidade.” Ora, por exemplo, o que o João, o Ebinho e eu temos em comum exceto a lealdade e a filoginia( amor as mulheres)?
Despedida de Solteiro, o início do fim...da vida de solteiro!
“Mas não se esqueça: Assim como não se deve misturar bebidas, misturar pessoas também pode dar ressaca.” Martha Medeiros
Em suma: todos os amigos do Bruno estavam lá, todos exceto um. Ou talvez estivesse, mas em outro plano, observando escondido, feliz, certamente, com a felicidade dos amigos. Sem striper (afinal nada é perfeito), mas rolou um churrasco de primeira classe, o truco “ladrão! 6!”, a rebelde música americana (o que não fazemos pelos amigos?), e é claro, a tradicional humilhação ao noivo. Após uma tentativa frustrada, constrangedora e patética de resistência de sua parte, dominamos Bruno, na faixa de uns 20 homens, o imobilizamos, despimos suas roupas, deixando-o só de cueca, o vestimos com indumentária feminina enquanto ele se debatia como um peixinho fora d’água, passamos batom escarlate em sua boca e rosto e por fim eternizamos esse momento glorioso tirando fotos nossas rindo como idiotas. Em verdade isso era só o princípio daquele traiçoeiro sábado cheio de altos e baixos para mim.
"Ele vai ser o precursor de alguma coisa!"
Obs.: No lugar dessa canção, Twist and Shout do filme Curtindo a Vida Adoidado deveria estar a fotografia do Bruno vestido de mulher abraçado a galera. Mas nao fui autorizado a publicá-la. Por que será?
A despedida de solteiro do Bruno tinha fenecido, mas meu amigo João Paulo, uma metralhadora russa, retornou novamente de Belo Horizonte e meu irmão caçula decidiu patrocinar um churrasco unissex no terraço. Tomamos todas. Não contarei dos sucessos particulares da noite. Como dizem os cretinos “Quanto menos você souber melhor será para você.” Só digo que o churrasco morreu lá pelas duas. Então, deliberamos como de fato executamos chamar nosso amigo Ebinho (24 horas no ar) e saímos o trio triunfal de carro para explorar a madrugada de domingo do Vale do Aço. Esquadrinhamos as três cidades irmãs, e já exauridos de Ipatinga e Timóteo, regressamos lá pelas 5 a Terra do Nunca, Fabriciano. Num bar barra pesada cheio de gente estranha, mas o único aberto naquela pré-aurora, ancoramos como um navio num porto desconhecido e enevoado.
Nada escapa a um homem com super-poderes de observação, nem o otário acompanhado duma mulher que não desviava os olhos de mim (confesso que era o mais bem vestido naquele lugar), nem os caras com cara de traficantes que jogavam sinuca ao fundo, nem o casal de lésbicas se beijando sensualmente do meu lado (uma delas dava um caldo, meu irmão) ou o mendigo tentando filar um cigarro de mesa em mesa, enervando os clientes e as funcionárias do bar, uma me confidenciou que não adiantava nem bater que ele sempre voltava (como algumas pessoas a certos relacionamentos, o que pode ser fatal.). Eu precisava comer alguma coisa para me galvanizar. Pedi uma vaca-atolada. Minha iguaria estava demorando, eu ficando irritado, se aquele desamparado nauseabundo viesse para o nosso lado considerando a chaminé de Hollywood que é o Joaozinho, eu iria apelar. Dá uma lição num indesejado mais fraco naquela altura do campeonato seria relaxante. Entretanto ele fitou meus olhos vazios como o seu estomago e se esquivou de nós. Foi filar outros menos perigosos. Enfim, ela chegou. Eu estava tão alto que perdi consideravelmente o sentido do paladar, apesar disso devorei-a com sofreguidão recheando-a com uma pimenta do inferno. Por último, perdi na porrinha e fui forçado a virar um copo grande de vinho. Virei e gritei escandalosamente: Thiago Castilho!!!
“O filhinho da mamãe ta passando mal? Vai beber mais, Thiago!” Minha mãe me dando bronca
“Mãe!”O bordão da minha vidae palavra considerada a mais bela de todas segundo pesquisa americana. Amor vem em segundo lugar, vida em terceiro, liberdade em quarto...
Por minha vida, morto estaria agora e não escrevendo estas linhas se arrependimento matasse, nobre leitora. Não mata, mas dói demais. Quando não seja inesquecível. Não houve vomito. Pior, ressaca, pior ainda, diarréia. Dois dias de cama. Uma dor lancinante durante todo sagrado domingo. Eu sentia umas pontadas agudas de dentro para fora elevando do abdômen como uma onda até meus olhos e arrebentando em gemidos de parto. Por fim, o hospital. “Ressaca e rins fudido” diagnosticou o medico em seu jargão de médico, é claro. “Corvos brancos” como diria mestre Nelson Rodrigues.
Vinho + cerveja + conhaque + vaca-atolada com pimenta pra caralho + irresponsabilidade = Ressaca!
Não sei se os senhores sabem, provavelmente sim, mas a ressaca é uma espécie de crise de abstinência. Tecnicamente, o conjunto de efeitos fisiológicos da ingestão exacerbada de bebidas alcoólicas. Como qualquer outra bebida ou alimento, o álcool é metabolizado e distribuído pela corrente sanguínea para todas as células do corpo. A sensação de embriaguez e relaxamento ocorre quando ele chega ao cérebro. É o momento da intoxicação. O corpo faz um grande esforço para dar conta das doses excessivas. Quem mais trabalha é o fígado, que precisa produzir enzimas para absorvê-lo, transformá-lo em gordura e secretá-lo pela bile. Quando o trabalho acaba, o fígado quer mais e entra numa espécie de depressão, desorganizando todo o metabolismo. O sistema nervoso, que também foi acelerado, tem uma reação parecida. O resultado é uma queda da força muscular, dor de cabeça, enjôo, diarréia, sensibilidade à luz e um cansaço enorme. Algo lhes parece familiar nessa descrição trágica do drama da ridícula ressaca, observadores?
“Evite a ressaca, mantenha-se bêbado.”
Uma ressaca afeta toda sua qualidade de vida. Sem alimentação, sem sono, sem rua por dois dias inglórios. Mas é certo que tudo passa e a vida continua. Sábado que vem tem mais. Brincadeira, é claro. Na minha vida, na vida do meu pai e na dos meus dois irmãos, tudo é minha mãe. Ela é o centro do nosso universo. Quando ela precisa sair ou viajar, raro, mas acontece, passamos fome, vestimos roupa suja e não tomamos café. É sempre triste. Mas eu faço o possível para deixá-la com remorso manipulando habilmente minhas requintadas palavras. Ela quase chora, mas nunca deixa de sair ou viajar quando tem oportunidade por causa disso. Mesmo assim cuidou de mim o tempo todo. Obrigado, mãe, te amo. Lembre-se, meu amor: a pior ressaca é sempre a próxima.
faço das palavras da sua querida mãe, as minhas!
ResponderExcluirMãe é mãe e ordens são ordens!
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