“A razão não é senão uma escrava da paixão.” Dostoievski
“Amar é dar o que não se tem a quem não o quer.” Lacan
A Isabela Boscov
"Um dramalhão bem ao estilo dos anos 50, mas da melhor estirpe, Um Lugar ao Sol deu razão à intuição do diretor: foi um sucesso retumbante de público. E virou um clássico."
Dirigido por George Stevens e roteirizado por Harry Brown e Michael Wilson, A Place in the Sun 1951 ou “Um Lugar ao Sol”, título em português, é um filme ianque adaptado da obra Uma Tragédia America, de Theodore Dreiser. Um Lugar ao Sol é também um drama romântico jurídico, por assim dizer, vencedor entre outros do Globo de Ouro 1952 (EUA) na categoria de melhor filme – drama, e dos Oscar de melhor direção e melhor roteiro de 1952. Não pretendo blasonar conhecimento técnico cinematográfico que não possuo, todavia minha sagrada opinião faço questão de compartilhar com meus nobres leitores.
“É que Narciso acha feio o que não é espelho.” Caetano Veloso
Um Lugar ao Sol exibe uma trama arrebatadora numa soberba fotografia em preto e branco e narra a história de George Eastman (Montgomery Clift), um ambicioso jovem que odeia seu passado de privações e está disposto a “vencer na vida” a qualquer preço. Oriundo de uma família de missionários “hippies” a qual ele despreza até a morte, George consegue um emprego na fábrica de confecção de trajes de banho femininos de seu tio milionário. Obcecado por um futuro melhor, ele julga que este trabalho servirá de degrau para sua escalada social. Apesar de ter sido alertado para não se envolver com nenhuma funcionária da fábrica, ele seduz Alice Tripp (a incrível atriz Shelley Winters) uma moça humilde e ingênua que trabalha na linha de montagem.
No meio do caminho tinha uma Cleópatra. Vivida por nada menos nada mais (até porque não poderia haver nada mais em parte alguma) que a absurdamente bela atriz Elizabeth Taylor aos 17 aninhos, Angela Vickers brilha e impera como a sofisticada personagem socialite por quem George se apaixona perdidamente e é correspondido graças ao seu charme de primo pobre com potencial para ascensão meteórica.
"Nada é bastante para quem considera pouco o suficiente." Confúcio
Em pouco tempo de trabalho George é promovido, finalmente eleva-se a sociedade aristocrática para qual fora invisível até então e decidi se afastar de Alice para se casar com Ângela. Porém é demasiadamente tarde para manipular o universo e se esquivar do destino. Quando vai terminar tudo com Alice ela anuncia “Temos um problema”. Alice estava grávida com G maiúsculo. Ela pressiona agressivamente George a se casar, obstinada a não perder seu grande amor “Estou cansada de esperar você. Você se casará comigo amanhã ou conto tudo aos jornais e logo depois me suicido.”. George afeta satisfazê-la, mas sabe que isso implicaria na renúncia de seus sonhos augustos e um desespero violento o possui.
“Se o que você quer em sua vida é só paz
Eu quero é ter tentação no caminho
Se você acha o que eu digo fascista
Mista, simplista ou anti-socialista
Eu admito, você tá na pista
Eu sou ista, eu sou ego
Eu sou ista, eu sou ego
Eu sou egoísta, eu sou,
Eu sou egoísta, eu sou,
Por que não?” Raul Seixas
Quando houve no rádio o alerta para que se tenha cuidado ao nadar num lago da região onde vários casais tinham se afogado no verão, aquela notícia penetrou profundamente em sua alma atormentada despertando idéias terríveis. Então, George levou Alice para um passeio de barco no lago perto do anoitecer. Entretanto desisti do plano de matá-la e após uma discussão passional
Sob o signo do ódio é talvez impossível compreender George, mas se afinarmos nossa visão empática poderemos ver através do abismo que ele parecia ser “um joguete do destino.” É preciso reconhecer que os deuses foram cruéis com o pobre George dando-lhe tudo primeiro para depois tirar-lhe até o que não tinha, o futuro. O filme me parece ser uma mensagem subliminar preconceituosa para os americanos desafortunados: pau que nasce torto morre eletrocutado. Talvez transcenda essa minha interpretação dos fatos. Talvez seja uma trágica história de amor verdadeiro que o devir (movimento pelo qual as coisas se transformam) quem sabe por inveja fez tudo para decepar e triunfou. Assim caminha a humanidade na voragem do vício onde os brutos também amam.
O Julgamento
“Eu tenho algo a te dizer.” George. “Conte para Mama. Diga tudo para a Mama.” Ângela. “Eu te amo. Te amei desde o primeiro momento em que te vi.” George. (Como não amar a tenra Elizabeth Taylor?) “Eu também te amo. Mas isso me assusta. Mas é maravilhoso.” Ângela. “É maravilhoso estar ao seu lado.” George. George era como uma velha amiga injustamente me acusou de ser “Um bico doce."
Promotor: O estado e seus membros acusam que o assassinato em primeiro grau foi cometido pelo prisioneiro George Eastman. Acusam que George Eastman voluntariamente, e com premeditação, crueldade e decepção, assassinou, e logo tratou de esconder da Justiça o corpo da Alice Tripp. De vocês depende, senhoras e senhores, decidir o que se fará com este homem, que burlou as leis morais e quebrou os mandamentos, que aumentou sua infâmia com um assassinato.
Promotor: Que sentia Alice por ele?
Testemunha 1( Amiga de Alice): Todos Sabiam que estava apaixonada.
Promotor: Qual era a regra exatamente?
Testemunha 2 (Gerente do fábrica): Acautelar que os trabalhadores enredassem relações com as garotas.
Testemunha 3 (Senhoria de Alice): Uma noite em agosto passado, fui procurar Alice pelo telefone. Foi ele que atendeu.
Promotor: Doutor, alguma vez viu o jovem?
Testemunha 4 (Médico): Não, mas depois de sair de meu escritório, ela ficou falando com um jovem em um conversível.
Advogado de defesa: Protesto.
Juiz: aceita-se.
Testemunha 5 (Da floresta): Por volta das nove se tropeçou com meu acampamento. Estava molhado e parecia assustado.
Testemunha 6 (Porteiro): Este homem estava na estação de ônibus com a garota. Estavam tendo uma discussão. Ela dizia que não se moveria a não ser que ele prometesse.
Promotor: Havia sinais de violência na Srta. Alice Tripp antes que se afogasse?
Testemunha 7 (Médico legista): Havia sido golpeada com força suficiente para atordoá-la.
Testemunha 8 (Homem que alugou o barco): Disse-lhe que não havia mais ninguém no lago. Logo depois assinou como Gilbert Edwards.
Promotor (Ainda para a testemunha 8): depois de ter assinado abaixo um nome falso, assegurou-se de que o ocorrido não seria presenciado por ninguém?
Advogado de defesa: Protesto, meritíssimo.
Promotor (Provocando): Ninguém exceto a pessoa que não pode testemunhar, A garota afogada?
Advogado de defesa (Levantando-se exaltado): A acusação não deve...
Promotor (com sarcasmo rápido): Retiro a pergunta. Não há mais perguntas.
Advogado de defesa (Dirigindo-se fixamente para o júri): Este rapaz está sendo julgado pelo ato de assassinato, não pela intenção de assassinar. Da idéia ao ato há uma diferença. Se considerarem o jovem culpado de desejá-lo, mas não de fazê-lo... ... então ele deve sair livre como vocês ou eu. Entretanto, desde quando a acusação faltou com as provas, causou-lhes prejuízos. Sem fatos, deu-lhes uma fantasia. Nenhuma das testemunhas que compareceram presenciaram o ocorrido. Chamo uma testemunha presencial, a única testemunha. Ele é o único que sabe a verdade, toda a verdade. George Eastman, por favor, suba ao estrado.
George Eastman: Quando chegamos, sugeri um passeio num barco antes que anoitecesse.
Segundo advogado de defesa: diga-me, por que deu um nome falso ao barqueiro?
George Eastman: Íamos ficar na cabana, e não estávamos casados, por isso pensei que seria melhor não dar nossos nomes reais.
Segundo advogado de defesa: por que alugou o barco para remar com a garota no lago?
George Eastman: No fundo da minha mente tinha pensado em afogá-la. (Nesse momento deflagra-se uma manifestação ruidosa no fórum. O juiz bate o martelo e ordena “Ordem”) Mas não queria alimentar esses pensamentos. Não podia pensar naquilo. Não podia fazer aquilo. (Com comoção, tentando o se colar colou.)
Segundo advogado de defesa: O que aconteceu depois que remaram?
George Eastman: Sabia que não poderia levar o plano até o final.
Segundo advogado de defesa: Então mudou de idéia?
Promotor: Protesto. Esta conduzindo a resposta.
Juiz: Aceito. A defesa não pode manipular as respostas de sua testemunha.
Segundo advogado de defesa: Sim, Excelência.
Segundo advogado de defesa: O que ocorreu depois?
George Eastman: Decidimos que deveríamos voltar para a pensão. Ela começou a falar de nos casarmos e de como seria nossa vida matrimonial.
Segundo advogado de defesa: Qual foi sua reação enquanto ela falava desse tema?
George Eastman: Ela me olhava. Sabia que não havia nada entre nós. Ela me acusou de desejar sua morte.
Segundo advogado de defesa: (Chegando o rosto bem próximo de George): Você desejou sua morte?
George Eastman: Não. Já não pensava mais nisso!
Segundo advogado de defesa: No que pensava nesse momento?
"A beleza perturba ou não é beleza"
George Eastman: Estava pensando em outra pessoa. (Eu não te culpo, parei o filme umas três vezes para contemplar o rostinho diabolicamente divino de Liz Taylor.)
Segundo advogado de defesa: Outra garota. Pensava que havia perdido essa garota e seu mundo para sempre. O que respondeu a acusação da Alice?
George Eastman: Lhe disse que não estava certa, que não desejava sua morte.
Segundo advogado de defesa: Estava alarmada ou assustada?
George Eastman: Até disse: “Pobre George!".
Segundo advogado de defesa: Continue.
George Eastman: Logo se aproximou da parte de trás do barco. Disse para ficar onde estava, mas ela me ignorou. Seguiu vindo e começou a cair. Eu comecei a me levantar. Ai tudo virou. Em um segundo, caímos na água. Eu estava apavorado. Algo me atingiu quando cai. Tudo ocorreu tão depressa. Não sabia o que estava acontecendo.
Segundo advogado de defesa: George, Alice estava consciente quando caiu na água?
George Eastman: Sim. Ouvi ela gritar, mas não podia vê-la porque estava do outro lado. Então nadei ao outro lado. Estava... Quando cheguei, tinha afundado. Nunca voltei a vê-la.
Segundo advogado de defesa: Jura solenemente que não a golpeou? (Será que o Roberto Podval, advogado dos Nardoni, tentou essa? “Jura solenemente que não defenestrou sua filha?”)
George Eastman: Juro!
Segundo advogado de defesa: Jura que não a empurrou?
George Eastman: Não fiz isso!
Segundo advogado de defesa: Que foi um acidente não desejado?
George Eastman: Juro-o. Juro-o. Juro-o.
Segundo advogado de defesa: Isso é tudo, Excelência.
Promotor: Aquela noite quando partiu da festa na casa do lago para encontrar-se com a Alice Tripp na estação, lembra-se de ter esquecido de algo?
George Eastman: Não. Não recordo ter deixado nada.
Promotor: Refiro a seu coração! O deixou na casa? Fez isso Sr. Eastman? Ali fora no terraço sob a luz da lua? Deixou a garota que amava, e com ela suas esperanças, suas ambições e seus sonhos. Não é assim? Eastman? Deixou tudo o que queria, incluindo a garota que amava. Mas tinha pensado voltar? Não? Responda!
George Eastman: Sim.
Promotor: Quando lhe disse aquela noite que ia visitar sua mãe, estava mentindo, não? Quando deu ao barqueiro um nome falso, estava mentindo?
George Eastman: Sim.
Promotor: Quando foi ao Loon Lake, que motivo deu a Alice Tripp para estacionar tão longe da pensão?
George Eastman: Que havia acabado a gasolina.
Promotor: Não havia voltado a mentir?
George Eastman: - Sim.
Promotor: Mentiras! Todos seus movimentos estão apoiados
George Eastman: Tudo igual, é verdade! Eu não a matei. (Eu acredito nele. De fato penso que ele não a matou. Apenas deixou que ela se afoga-se ao contrário do que o feroz promotor fez os jurados acreditarem.)
Promotor: Então insiste em mentir sobre isso também. Veremos.
Promotor: (Nesse momento é inserido uma replica do barco no tribunal) Suba ao barco e mostre aos jurados o que ocorreu quando o navio naufragou.
Promotor: Fique onde estava quando ocorreu a morte. Quando a garota se levantou para aproximar-se tropeçou nesta altura?
Juiz: Fale mais alto.
George Eastman: Sim.
Promotor: E depois?
George Eastman: Virou de lado na água.
Promotor: E depois?
George Eastman: O barco virou sobre nós.
Promotor: E que aconteceu depois?
George Eastman: Não podia ver com clareza. Foi como um golpe, quando a quina do navio a atingiu.
Promotor: Muito provavelmente! Depois desse golpe acidental, a que distância estava você?
George Eastman: Não sei exatamente.
Promotor: Não podia estar a mais de um metro de distância.
George Eastman: Estava mais longe.
Promotor: Daqui ao jurado, a metade de caminho, ou o que?
George Eastman: Daqui ao jurado.
Promotor: Pois não. Quando voltaram à superfície estavam a
George Eastman: Não sei.
Promotor: Caminhe até aqui. O navio estava daqui até o Promotor?
George Eastman: Não sei.
Promotor: Esta me dizendo que não pôde ter nadado até a fraca jovem e agüentá-la até chegar ao barco? (Antes que George pudesse responder, gritando:) Mentira! Ela estava se afogando, e você deixou que se afogasse. Ela estava indefesa, você pegou o remo e golpeou sua cabeça. (Eu preciso comentar essa parte. É o orgasmo do filme. O promotor ergue o remo e bate-o contra o barco, despedaçando-o diante do público e arrancando gritos de horror no tribunal e atirando diretamente nos olhos de George, por assim dizer. Tudo acabou ali. Ele ganhou o júri e destruiu qualquer sombra de dúvida. E o promotor continua o massacre mastigando lentamente o pobre George. Acho que lançar uma pedra ao lago nunca custou tão caro para alguém.)
Promotor: Você levou a pobre garota ao lago. A observou enquanto se afogava. (George com olhos esgazeados fita o promotor como quem fita a sua própria alma no espelho e o que ele vê é o retrato de Dorian Gray)
Promotor: Não é essa a verdade?
George Eastman: Não. (Com a cabeça no chão, vencido e prevendo as tensões elétricas de 20 000 volts)
Promotor: Isso é tudo, Excelência.
(...)
Juiz: O júri chegou a um veredicto?
Representante do júri: Sim, Excelência.
Juiz: Que se levante o acusado. Que se leia o veredicto.
Representante do júri: Consideramos o acusado, George Eastman, culpado de assassinato em primeiro grau.
Juiz: Ordem na sala!
Recado de George para sua mãe:
“Mamãe, condenaram-me, George.”
"Adeus, George." Angela
Em verdade meu amigo Eberson que me indicou esse filme inesquecível, que em pesquisa descobri ser o queridinho dos professores de direito penal. Assim, a meu pedido Eberson escreveu especialmente para o Esconderijo uma concisa e eloqüente crítica sobre ele . Eis sua visão de Um Lugar ao Sol:
“O preço da redenção é a Verdade!
Um exercício cinematográfico onde a natureza humana é investigada na sua essência. Até que ponto você iria para vencer na vida, subir a escada e chegar ao topo do mundo? O que você faria se tivesse que escolher entre a “grande chance” e seus princípios morais básicos e seus valores éticos? O personagem de Montgomery Clift é um jovem ambicioso entre a cruz e a espada, que terá seu caráter colocado a prova. O filme é uma obra-prima no conjunto da concepção, direção segura e excepcional e um roteiro impecável, tendo atores talentosos tirou-lhes emoções magistrais e grandiosas. Elizabeth Taylor é uma visão de encantamento, diamante lapidado e presença exuberante na tela que não diminui suas capacidades dramáticas. Um deleite para os amantes da sétima arte, oferecendo-nos uma experiência que nós faz refletir sobre o preço de uma escolha errada e suas conseqüências.A cena em que o promotor simula (reconstitui), a forma covarde e brutal como o réu assassinou a jovem apaixonada de forma premeditada é espetacular e emocionante. Diz o promotor: Vejam, ela está ali se afogando e pedindo por socorro e ao invés de ajudar aquela alma inocente ele a golpeia, e golpeia... mais!! O personagem de Montgomery Clift é um iluminado pela sorte, porém não teve talento para administra - lá e a entregou ao azar.” Crítica por: We.ber.son Pri.eas.tley (Ebim)
“O amor é um jogo de xadrez jogado por jogadores de pôquer.” Thiago Castilho
EDO recomenda: Livro: “Crime e Castigo” Dostoievski;
Filme: Um Lugar ao Sol, baixar em: torrent (Place in the Sun)
Post relacionado: http://esconderijo-do-observador.blogspot.com/2009/08/o-edo-recomenda-series-juridicas_9480.html
Deixe seu comentário, leitor: Até que ponto você chegaria por um lugar ao sol?
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