
A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PENAS
Segundo o grande poeta
mineiro Carlos Drummond de Andrade “Toda história é remorso.”, e a história do
Direito Penal nos cientifica que a humanidade escreveu lenta e lacrimosamente
sua biografia de reconhecimento e respeito aos Direitos Humanos desde seus
primórdios em que se aplicavam penas grotescas e mortais, até os dias atuais
ansiosos pela Justiça Restaurativa, essa nobre e promissora justiça de
vanguarda, que prima pelo diálogo na solução dos conflitos interpessoais e na
recuperação de todos os envolvidos na lide penal: vítima, ofensor, Estado e
comunidade.
Na Antiguidade,
concomitante a formação do Estado, quando havia uma violação dos direitos
individuais ou coletivos reinava o caos da “vingança privada”, arbitrária e
desproporcional. Um exemplo notável dessa atroz realidade corresponde à infame
lei das “cinco penas” consagradas na China Antiga: “O homicídio penalizado com a morte, o furto e as lesões penalizados
com a amputação de um ou ambos os pés, o estupro com a castração, a fraude com
a extração do nariz e os delitos menores com uma marca na testa.”. Embora
penas semelhantemente severas subsistam em certos Estados contemporâneos como a
pena capital ou pena de morte nos Estados Unidos e a lapidação ou pena de morte
por apedrejamento na Nigéria, na maioria dos países democráticos ocidentais
coevos tais extremos penais são, felizmente, moralmente inaceitáveis e ilegais.
O célebre Código de Hamurabi é o cânone jurídico desse período perverso e a lei
de Talião (“Olho por olho, dente por dente, vida por vida...”), por incrível
que pareça, foi considerada um avanço triunfal dos direitos humanos na época
por se pautar no “princípio da proporcionalidade” pela primeira vez na história
humana.
Na Idade Média com o esfacelamento
do Estado, o advento do feudalismo e a ascensão da Igreja Católica, as penas
aplicadas agora eram: (...) a perda da paz (Frieldlosigkei), que consistia em
retirar a tutela social do apenado, com o que qualquer pessoa podia matá-lo
impunemente, esquartejamento, fervura, empalamento, esmagamento por elefante,
afogamento, morte pela fogueira, morte pela espada (para os fidalgos),
enterramento vivo, entre outros castigos draconianos e execuções excruciantes.
Contudo, data da Idade Média a poderosa partícula primordial que observamos das
constituições contemporâneas, a Magna Carta de 1215, um documento que
expressava à resignação do rei às leis editadas e fundamentava o princípio da
legalidade e da inviolabilidade de domicílio.
Na Idade Moderna com o
Renascimento, a recuperação do Estado e a influência das ideias iluministas
operou-se uma humanização, embora incipiente, do Direito Penal. Um dos
diamantes do Direito de grande influência dessa época é a obra “Dos delitos e
das penas” assinada pelo italiano Marquês Cesare Beccaria no século XVIII. Dois
países se sobressaíram nessa reformulação racional das normas criminais:
Inglaterra e França.
Na Inglaterra, foi
imposta pelo Parlamento em 1628 a Petição de Direitos, um documento que
garantia as prerrogativas do devido processo legal, o duplo grau de jurisdição
e a legalidade. Em 1679 foi assinada a Lei do Habeas Corpus, remédio jurídico
que protege o direito de locomoção contra coação ilegal de autoridade. Em 1689
foi elaborado pelo Parlamento inglês a Declaração de Direitos (Bill of Rights),
que entre outros feitos estabelece o direito a instituição do júri e define seu
modus operandi.
Na França aconteceu o
fato de maior impacto na evolução histórica das sanções criminais, a decisiva
Revolução Francesa de 1789, enunciada pela imortal epígrafe iluminista cunhada
pelo filósofo francês Jean-Jacques Rousseau “Liberdade, Igualdade e
Fraternidade” (Liberté, Egalité, Fraternité), resultou no fim do feudalismo
medieval e na publicação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
inspirada na Declaração de Independência dos Estados Unidos. Assim, os
franceses aspiravam a uma mudança de mentalidade mundial no multicosmo
sociopolítico, econômico, cultural e jurídico. No coração dessa revolução
radical e abrangente, “a base do Direito Constitucional moderno”, está a conquista
da “presunção de inocência”, um princípio central do Direito Penal, a partir do
qual passou-se a exigir a necessidade de provas nos autos para a condenação do
acusado, outrora submetido a simples convicção do juiz.
Depois das sangrentas
guerras mundiais do século XX que violaram todas as fronteiras éticas da
humanidade uma nova consciência jurídica começou a se modelar no mundo visando à
defesa dos direitos humanos e o aperfeiçoamento do Direito Penal como um todo.
Assim, as penas paulatinamente passaram a se humanizar com o propósito de
proteger a dignidade do condenado. Eis o embrião ideológico da magnânima
Justiça Restaurativa.
Por:
Thiago Castilho
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