40 anos antes
Cara ou coroa?
Eu me lembro quando recebi o convite para fazer parte do Grupo de Estudo de Cultura Constitucional do Curso de Direito da Faculdade Pitágoras. Um professor chegou para mim e disse “É o seguinte, Thiago. Eu não te conheço, não conheço sua capacidade, sua produção acadêmica, mas o professor Denner pediu para convidá-lo para participar de uma reunião do grupo de estudo de cultura constitucional, na sala 201, segundo andar, quinta-feira as 17:30. Nós nos reunimos toda quinta para estudarmos temas relacionados a Constituição. Apareça. E oh, deixa isso off, por favor.” Aquele convite, como diria Hannibal Lecter, “tinha um certo charme.” Eu não sabia o que era o grupo de estudo nem mesmo de sua existência. É uma espécie de sociedade secreta do direito constitucional, ou pelo menos era antes deu revelá-la, dentro dos limites éticos, claro. Fui por curiosidade e não me arrependi.
"Você acha que está a fim de brincar com a lei?" Bob Dylan, Hurricane
O grupo de estudo de Cultura Constitucional em verdade corresponde a tropa de elite intelectual da Faculdade de Direito, composto por professores de direito constitucional e os melhores alunos de toda a faculdade forense de variados períodos, algo em torno de 20 membros. O ingresso só se dá por convite. Sinceramente eu não sei se mereço está ali, talvez não, mas de lá agora eu só saio expulso formalmente e pra ser sincero de novo eu fui acolhido com hospitalidade e me adaptei bem ao meio. A estrutura do grupo implica seminário e debate e é organizada de forma cíclica, cada semana uma equipe de alunos coordenada por um professor apresenta um tema constitucional polemico que depois será discutido pelo grupo; e a interação entre os integrantes apesar de extremamente respeitosa e polida, como deve ser no meio acadêmico ou qualquer outro, é controversa e fervorosa. Estudar direito constitucional é conhecer a alma humana em sua essência mais aguda, qual seja o desejo de humanidade, democracia e justiça social e as necessárias transformações para concretizá-los, parafraseando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Tem sempre alguém melhor!
Como essa semana era a vez de apresentar da equipe do Prof. Dr. Denner Franco, da qual faço parte, lá fui eu com a cara e a coragem abrir o seminário sobre “Do Controle de Constitucionalidade a Luz do Principio da Simetria”. Se tudo tivesse saído como planejei eu teria dito:
“Saudações jurídicas, nobres professores e insignes condiscípulos! Um início enfático é como um bom beijo, abre caminho para o resto, certo?
Bem, vamos ao que interessa, “Do Controle de Constitucionalidade à Luz do Principio da Simetria.” Mas antes de chegarmos ao clímax, senhoras e senhores, como convém passaremos primeiro pelas preliminares, ou seja antes de tratarmos do controle de constitucionalidade a luz do principio da simetria, vamos retornar ao epicentro de tudo, qual seja a suprema Constituição e definir o conceito de principio da simetria para que nossos colegas possam desenvolver e concluir o seminário com sucesso.
Tentando copiar o generoso método didático do professor Dr. Tiago, porque eu observei que ele se comunica com o público como se este estive tendo contado com aquela informação pela primeira vez...
Como ganhamos ou ganharemos ainda muito dinheiro para sabermos bem, a sagrada Constituição Federal é o centro do sistema jurídico. Sua supremacia é formal, material e axiológica havendo em contrário a inconstitucionalidade. Todo ordenamento jurídico é interpretado a luz da Constituição. Ela dispõe sobre a organização do Estado, forma e regime de governo, sistema político e eleitoral, estrutura e organização dos poderes e sobre as garantias e direitos fundamentais do cidadão.
Assim, para uma correta interpretação do texto constitucional, o interprete goza dos princípios hermenêuticos dentre os quais se destaca o principio da simetria. O principio da simetria constitucional é especial, não porque foi o escolhido pela minha equipe, mas porque exigi, por assim dizer, a transmissão dos genes normativos da constituição federal para as constituições dos Estados-membros, ou seja, o princípio da simetria, segundo consolidada formulação jurisprudencial, determina que os princípios magnos e os padrões estruturantes do Estado, segundo disciplina a Lei das leis, sejam tanto quanto possível objeto de reprodução nos textos das constituições estaduais. Agora passando o bastão para...”
"... essa teria sido uma boa ocasião para mentir, mas a verdade é um hábito terrível." Don Juan - Lord Byron
É claro que a minha apresentação foi um lixo. É a clássica primeira vez constrangedora. Ansiedade. Tensão. Nervosismo. Insegurança. Timidez. Eu comecei falando e terminei lendo. Obliterei trechos, simplifiquei outros e tive o ritmo de uma escola carnavalesca russa, se existe. Quase gaguejei. Eu não conseguia respirar, me sentia como Prometeu tendo o seu fígado sendo dilacerado por uma águia e ainda podia ver Bob Dylan no fundo da sala cantando melancolicamente irônico “How does it feel - Como se sente? How does it feel - Como se sente? To be on your own - Por estar por sua conta? Like a rolling stone? - Como uma pedra a rolar?” É nessas horas que me odeio por ser pseudo-esquizofrênico. Sem contar os sonhozinhos freudianos premonitórios. Acreditem ou não, na noite anterior a minha traumática apresentação eu tive um sonho soturno no qual na quinta em questão eu acordava sem voz e estava “totalmente perdido.” Sequer posso me alijar dizendo que ainda não tinha estudado a matéria em pauta ou que preparei meu roteiro nas coxas horas antes de acioná-lo porque não tive tempo suficiente para decidir o que expressar. Essa não é a questão. Eu me conheço bem embora ainda muito mal. Eu teria me afogado de qualquer jeito. Foi uma experiência excruciante de autoconhecimento. Eu preciso evoluir muito no quesito comunicação oral formal em seminários jurídicos. Segundo o prof. Dr. Denner “É para isso que serve o grupo de estudo.” É impressionante, escrever é fácil, falar não é fácil. Entretanto, se o desejo é a coisa mais importante da vida, este não me falta.
Meu discurso se estiolou, mas por mais duro que eu possa parecer comigo mesmo, não se preocupe, querida, eu me perdoarei e continuarei “sempre em frente”. Só que da próxima vez mais, como diria Drummond “Pulverizado, sereno, minucioso, implacável.” Porém pelo menos eu depreendi três lições marcantes desse acontecimento. Lição 1: pesquise sobre assunto, domine a matéria e ensaie muito antes. Lição 2: Humor não funciona, metáforas ousadas não funcionam, gestos histriônicos não funcionam. Seja objetivo e exato como Hans Kelsen. Lição 3: Não seja subjetivo nem ambicioso demais. Num grupo de estudo jogue pelo time. Esse é o espírito. Observados esses pontos, é preciso dizer por fim que o Vagner se saiu muito bem e salvou a honra de nossa equipe. Parabéns, meu caro e obrigado. Eis nosso trabalho:
DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE À LUZ DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA
1. Decorrente da estrutura a Federação brasileira e da idéia de supremacia e rigidez constitucionais, o princípio da simetria transplanta para a esfera estadual e municipal as grandes linhas organizatórias imediatamente aplicáveis à União Federal por força da Constituição da República
2. Simetria = Paralelismo.
Repetição obrigatória, em face da supremacia da Constituição.
3. Art. 25 CF/88: “Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição”.
§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.
4. “Mas que não se confunda a autonomia estadual com a soberania reconhecida ao Poder Constitucional Originário. O art. 25 da Carta Magna afirma que os Estados organizam-se e regem-se pelas constituições e Leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição”. (José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 17ª ed. Malheiros, pág. 595.
5. “Alguns desses princípios geram limitações expressas, outros limitações implícitas; e há, por fim, aqueles que são limitações decorrentes do sistema constitucional adotado. É dessa última espécie o princípio da simetria”. (Voto Min. Moreira Alves, ADI 2314-4 / RJ Medida Liminar).
Simetria ying yang
6. O STF tem decidido no sentido de que as normas do processo legislativo federal são, simetricamente, de adoção obrigatória pelos estados membros. RE 225.602-CE, rel. Min. Carlos Veloso, Lex-JSTF 271/175; RE 232.739-SP, rel. Min. Sydiney Sanches, RTJ 174/236.
7. Para o eminente Ministro Menezes Direito† “deve ser modulado o princípio da simetria, permitindo-se ao legislador estadual dispor sobre o processo legislativo de modo diverso do previsto na Constituição Federal sempre que não se configure qualquer violação a direito público vinculado à realização do ideal social e da organização estatal”. (ADI 3761/SP).
8. Princípio da simetria X Princípio da separação dos poderes (autonomia dos estados).
Juízo de ponderação???
9. Agravo de Instrumento 1.0713.08.077905-9/0001(1). Execução de Certidão de débito do TCE.
10. Constituição do Estado de Minas Gerais
Art. 76 - O controle externo, a cargo da Assembléia Legislativa, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas, ao qual compete:
§ 3º - A decisão do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terá eficácia de título executivo.
Pintura “Advogados”
11. Constituição Federal
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
§ 3º - As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.
12. CPC
Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:
VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.
13. CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
14. Questionamento:
Pode, em nome do princípio da simetria, Constituição Estadual dispor de matéria de competência privativa da União?
AUTORES: Denner Franco, Vagner Ramos, Lourenço Godoi, Alessandra Andrade E THIAGO CASTILHO
Programa Saber Direito(Resumo) Processo Legislativo –TV Justiça – Concursos
Igual-desigual
“Eu desconfiava:
todas as histórias em quadrinho são iguais.
Todos os filmes norte-americanos são iguais.
Todos os filmes de todos os países são iguais.
Todos os best-sellers são iguais.
Todos os campeonatos nacionais e internacionais de futebol são
iguais.
Todos os partidos políticos
são iguais.
Todas as mulheres que andam na moda
são iguais.
Todas as experiências de sexo
são iguais.
Todos os sonetos, gazéis, virelais, sextinas e rondós são iguais
e todos, todos
os poemas em versos livres são enfadonhamente iguais.
Todas as guerras do mundo são iguais.
Todas as fomes são iguais.
Todos os amores, iguais iguais iguais.
Iguais todos os rompimentos.
A morte é igualíssima.
Todas as criações da natureza são iguais.
Todas as ações, cruéis, piedosas ou indiferentes, são iguais.
Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou
coisa.
Não é igual a nada.
Todo ser humano é um estranho
ímpar.” Carlos Drummond de Andrade
“Enfrente algo que é difícil; isso te fará bem. A menos que você tente fazer algo além do que você já domina, você nunca crescerá” Ronald Osborn
Para mim que sou um ex-misantropo radical falar em público é um desafio. E para você, leitor? Tem a malandragem? Sempre foi assim?
Inicio fazendo das suas as minhas palavras, "saudações jurídicas caro Castilho". Comparo você a um minério precioso ainda não lapidado, escondido numa mina ainda não explorada, contudo, brilha de uma forma única, aparece no meio da multidão. Garoto quase mudo faz desviar o olhar pelo jeito excêntrico, não esquisito e sim particular, óculos que esconde e uma boina que mostra, pura dualidade.
ResponderExcluirA dura verdade do início, medo, esquecimento, timidez, calafrio, menos medo da morte do que falar em público, tudo puramente normal.
Sua apresentação foi boa, apenas foi dominado pelo nervosismo, estava evidente e estampado em seu rosto. Também aconteceu e acontece comigo, conheço algumas dicas e tenho alguns livros. Se quiser é só falar.
Caro Tiago, boa noite!
ResponderExcluirExtraordinária é sua capacidade de capturar o sentido da mensagem que tentamos passar e converte-la em matéria clara e sólida.
Parabens a voce pela capacidade e facilidade com o mundo abstrato e obrigado pelas gentis palavras. Nao sou vidente, mas sem sombra de dúvidas, vejo no horizonte um futuro brilhante em sua carreira jurídica, e com certeza, o direito é quem logrará êxito maior com o seu brilho.
Abraços!
Jose Fernando.
Que isso gente, assim eu fico emocionado.
ResponderExcluirObrigado.