Acima:
Vídeo-aula sobre o julgamento em plenário, quando o professor fala, em
especial, sobre os debates orais e os quesitos.
Júri simulado
A minha turma
Faculdade Pitágoras, 12 de junho de 2012, dia
dos namorados e noite do nosso júri simulado (turma do 8º período, atualmente
9º da Faculdade de Direito) idealizado pelo paulista nosso querido prof.
Fernando Celso (Salvo engano elegido como o paraninfo da nossa turma, caso
aceite o convite, claro. O prof. homenageado será o Leandro Valadares, caso
aceite o convite, claro. A votação foi apertada, outros nomes surgiram como o prof.
Hélio Cimini e do prof. Gustavo Lana, eu confesso que votei na prof. Priscila e
na prof. Eliane. Meu argumento era teoricamente invencível. Por que eleger dois
professores quando podemos eleger duas professoras? Seria mais charmoso. Seja
como for, a eleição não deixou de ser boa e justa. Ambos os professores tem grande
ascendência e afeição pelo nosso clã e são correspondidos.)
Personagens:
Juiz:
Wallace Aquino
Réu: Hamilton
Cássio (substituto de última hora do antigo réu Talles Gomes, vítima de uma
diarreia demoníaca, embora ele negue)
Júri:
composto por 7 acadêmicos selecionados na instituição
Promotores (as): Dannielle Oliveira, Márcio Mariano, Késsia Ribeiro
Advogados (as) de defesa: Artur Henrique, Raissa Rodrigues, Seu João Aurelino
Colaboradores: promotoria - Cristiniane Lauar ; Defesa - Thiago Castilho
Policiais:
Fábio Neiva e Franciele Ferreira
Escrevente:
Rui Pereira
Oficiais de Justiça: Heloísa Martins e Geisiane Moreira
Um júri
simulado na Faculdade de Direito sempre começa antes de começar. Primeiro, naturalmente,
é feito o anuncio do projeto pelo prof., depois vem o processo de seleção dos
personagens e então iniciam-se os preparativos (estudo do caso e dos procedimentos
formais a serem aplicados pelas partes e o juiz durante a sessão além da
elaboração das teses de acusação e defesa) que durarão meses e abre-se a mesa
de apostas e provocações que sempre antecedem o combate. “Se eu perder para você abandono a Faculdade de Direito.” Disse o
nosso aguerrido Márcio Mariano ao nosso reativo Artur Henrique que replicou “Sentiremos saudades suas.”. O Márcio já
abandonou duas faculdades: medicina e engenharia. E agora corria o risco de
abandonar uma terceira. Não sei por que estudantes de direito tem fama de
“ratos assassinos” não somos, somos?
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS - CAPÍTULO I
- DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS;
“XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri,
com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes
dolosos contra a vida.”
Acima:
Márcio, Cristiniane, Artur, Wallace e Raissa, Geisiane, Seu João
Lá fora
certamente cintilava uma doce e serena noite de junho, a mais romântica do ano,
dentro da nossa sala de aula, espaço em que fora reconstituído a estética do
Tribunal pelo Wallace, a saber, com a providencial ajuda das funcionárias da
limpeza da faculdade que foram convidadas e compareceram ao nosso júri, nossa
guerra particular deflagrava-se. Porque júri é guerra. E guerra é guerra. E
como poderia faltar o general? Nosso coordenador do curso de Direito, Ronan
Afonso, não deixou de nos parabenizar, desejar um grande júri e intimar uma
cópia de sua filmagem, posto que não poderia ficar em tempo integral para nos
assistir devido sua agenda repleta de coordenador, juridicamente compreensível.
Aliás, somente hoje tive acesso a uma mídia do júri e é pena não poder postá-la
aqui devido o arquivo ser demasiadamente extenso. Mas enfim, tentarei traduzir
o espetáculo, sinteticamente, em palavras.
Wallace,
nosso juiz cuja atuação pode ser definida numa palavra: impecável, abriu nosso
júri agradecendo a presença de todos e em especial do ilustre prof. Fernando “Pela
excelência em que o senhor realiza seu trabalho de mestre e pela oportunidade
de nos propiciar essa importante experiência que é o Tribunal do Júri.”. Antes
de tudo, é preciso dizer que nosso júri simulado foi baseado em fatos reais. Por
ética, substituímos o nome dos envolvidos. Como disse nosso magistrado “As
acusações penais são sempre coisas um pouco constrangedoras.”. Não é? O
objetivo era demonstrar de forma prática como se desenvolve o processo do
Tribunal do Júri. Procedeu-se a chamada, sorteio e seleção dos jurados. Após
isso, o juramento dos jurados: “Senhores
jurados, em nome da lei concito-lhes a examinar essa causa com imparcialidade e
a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da
Justiça.” E um por um todos disseram: “Assim
prometo.” Adiante.
Entenda o caso: Tudo começou por causa de uma bebida que o réu
se recusou a pagar para a vítima num café sujo, “Não pago nada para ninguém.”.
Então, a vítima lhe disse “Você não é mais meu amigo.”. Desde então a vítima
deu início a uma perseguição infernal ao réu com direito a socos e pontapés,
agressões gratuitas recorrentes (sempre que se cruzavam como ventos na rua) e
ameaças de morte que um dia haveriam de se cumprir. O pior aconteceu por causa
de uma mulher que rendeu ao réu duas facadas, uma nas costas, outra na barriga,
além de várias pauladas na cabeça, e uma estadia no hospital, onde só não
morreu porque Deus não quis. Então, tentou mudar de endereço para parar de ser
“covardemente agredido e humilhado” pela vítima. Mas o mundo era pequeno demais
para os dois. Nem bem se mudou de casa e ao sair na rua com sua filhinha colidiu
de frente com a vítima que com o dedo indicador fez-lhe uma ameaça de morte.
Aquilo fora a gota d’água e o réu decidiu que a caça tornar-se-ia o caçador.
Eis a denúncia oferecida pelo Ministério Público
contra o réu:
R. F. V. ,brasileiro,
solteiro, pedreiro, nascido em Alfié/MG no dia 15/10/1969, filho de...,
residente e domiciliado na ..., Timóteo/MG
Pela prática dos seguintes fatos:
1.
O denunciado, no dia 27 de setembro de 2003, durante o dia, no Córrego Choupana,
no bairro Santa Cecília, nesta cidade, fazendo uso de uma garrucha calibre 32
(fls. 11), que portava sem autorização e em desacordo com regulamentação legal,
efetuou disparos de arma de fogo contra A.G.G. com a intenção de matá-lo,
causando-lhe as lesões descritas do no auto de corpo de delito de fls. 34/37 do
inquérito policial em epígrafe, lesões que, por sua natureza e sede, foram a
causa da morte da vítima.
1.1.
O denunciado, disposto a matar A.G.G. para pôr fim a desavenças antigas,
armou-se e saiu a sua procura, encontrando-o nas margens de um córrego. De arma
em punho, iniciou uma perseguição, quando a vítima, tentando fugir e
aparentemente embriagada, caiu. A.G.G. ainda estava dominado e sob a mira da
arma de fogo. Antes que a vítima pudesse se levantar, R. F. V. efetuou
dois disparos. O primeiro tiro atingiu A.G.G. na região infraclavicular
esquerda, indo o projétil alojar-se no esôfago, após transfixar-lhe o pulmão
esquerdo. Não satisfeito e procurando certificar-se de que a vítima não
sobreviveria, efetuou um segundo disparo, que atingiu a região frontal da
cabeça da vítima, vindo o projétil a alojar-se na base anterior do cérebro após
transfixá-lo.
Acima:
sagaz, sarcástico e sedutor! O famigerado advogado-tubarão.
Entenderam a
tragédia? Temos aqui uma vítima-algoz e um pedreiro matador (Pedrinho matador?
Quem?). Após a leitura das declarações prestadas pelo réu na delegacia e quando
questionado pelo juiz se as acusações lhe imputadas eram verdadeiras, cuja
resposta foi “Sim”, e por qual motivo cometeu o crime o réu falou de maneira
imortal “Porque ele disse que iria me matar. É melhor a mãe dele chorar do que
a minha.”. O que não fazemos pela nossa mamãezinha querida?
.
Tese da acusação: Assassinato premeditado a sangue-frio. O promotor Márcio Mariano foi do princípio ao fim um debochado. Iniciou
dizendo que o réu Tales (como foi alcunhado na simulação forense) “Vulgo
Negão”, aniquilou a vida da vítima que tinha apenas 28 anos e um futuro
brilhante pela frente e que agora só restavam as lágrimas de sua mãe a quem o
conselho de sentença deveria consolar condenando o réu e fazendo justiça. Márcio
salientou que o réu possuía duas armas sem permissão legal em sua casa, que
saiu armado com sua garrucha calibre 32 com a intenção inequívoca de matar a
vítima, afinal foram dois tiros. Além de ter o hábito politicamente incorreto
de bater em sua ex-namorada. Já minha doce amiga Daniela iniciou sua
sustentação oral afirmando que o papel do Ministério Público é promover a
justiça e estava ali em defesa do bem supremo: a vida. A promotora reiterou que
os jurados eram responsáveis pela resposta da sociedade em face do crime
cometido. “Esse senhor tirou a vida de alguém. Ele pode sair impune?” Xequeou a
promotora e concluiu dizendo “Foi um ato de covardia.”. Já a promotora Késsia
em sua breve aparição declarou que seu receio maior pairava não sobre o ato dos
maus, mas sobre a omissão dos bons. E exigiu Justiça.
.
“Eu
sou o melhor. Eu sou o mais bonito.” Muhammad Ali
Tese da defesa: Legítima defesa putativa. A defesa abriu com a bela
doutora Raissa que iniciou dizendo que acusar é “muito fácil” e que o réu era
um “pobre coitado”. Teve a criatividade de compará-lo a uma nota de dinheiro
pisada por todos que nem por isso perde o seu valor. E possuída pelo espírito
do Direito, dramática e passional, Raissa vociferava, desafiando aos jurados
“Se querem condená-lo, condenem-no! Mas isso é um ato fraco, banal. (...)
Clemência, senhores jurados, eu lhes peço clemência. Todos nós merecemos uma
segunda chance. Temos que admitir que em seu lugar não teríamos outra atitude.
Ele era ameaçado de morte. Entre a sua vida e a minha, perdão, mas será a
minha. Peço perdão por ele e que com a benção de Deus ele seja reinserido na
sociedade.”. Já o senhor doutor João Aurelino argumentou principalmente que
privá-lo da sua liberdade por longos anos iria prejudicar seus filhos e sua
família. Afinal, as cadeias brasileiras não reeducam ninguém segundo João, mas
são universidades do crime além de serem sustentadas pelo nosso dinheiro. (Se a
moda pega, imagina?)
O
Código Penal Brasileiro dispõe a respeito da legítima defesa em seu art. 25,
verbis:
“Art.
25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios
necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de
outrem.”
Para
ZAFFARONI, trata-se a legítima defesa putativa de "uma causa de ausência
de culpabilidade, motivada no erro, que impede a compreensão da
antijuridicidade da conduta"
Já o doutor
Artur merece um parágrafo só seu. Artur como os outros iniciou agradecendo a
presença de todos, principalmente dos jurados que “Com toda certeza vieram aqui
hoje para encontrar a justiça e eu com toda a certeza a ofertarei a vocês.”.
Artur contrapôs argumento por argumento da promotoria. Enfatizou os insultos
verbais e as agressões físicas e psicológicas suportadas pelo réu, e
audaciosamente insinuou que todos no recinto, embora não pudessem ser
estupradores ou ladrões em potencial “Porque isso é uma questão de caráter”,
poderiam se tornar matadores dependendo das circunstancias. Artur argumentou
que o limite da fronteira fora ultrapassado quando o réu sentiu que sua família
poderia se tornar um alvo da vítima. Afinal, a derradeira ameaça aconteceu
quando o réu estava acompanhado de sua filha. Por fim, Artur afirmou que os
tiros disparados não tinham intenção de matar e com um gesto teatral inovador levou
um laser para o Tribunal a fim de provar sua teoria. “O que mudou foi o angulo
do corpo da vítima e não do atirador.”. (Isso me lembra uma máxima do Cisne
Negro “Sexo anal não engravida, querida.”.) Segundo o advogado de defesa a
situação tornou-se insustentável, era matar ou morrer. O que é humanamente
compreensível.
.
“Deboche, eu? De maneira nenhuma!” Márcio
Mariano
O
Márcio Mariano não se parece com o protagonista do seriado “Lie to me”? (Minta
para mim), versão brasileira, é claro? Devo dizer que embora todos tenham dado
o sangue para realizar um grande júri e a noite tenha sido do Artur, o velho
Márcio foi o preferido do Cisne Negro. Por que será?
Considerações finais: Nas considerações finais o promotor Márcio Mariano
atacou a fala da doutora Raissa dizendo que “Deus é amor, mas também é justiça.
(...) Dentro do presidio tem igreja. Procurá-la fará muito bem ao réu. (...) Em
momento algum o réu deu condições a vítima de se defender. Por isso a
qualificadora. Um crime bárbaro desse não pode ficar impune.”. Já Artur finalizou
dizendo que “in dubio pró reo” (Expressão latina que significa “Na dúvida,
decida-se em favor do réu.). Quem poderia afirmar depois da extraordinária estratégia
do laser que o réu indubitavelmente desejava exterminar a vítima? (Um tiro
assusta muita gente. Dois tiros assustam muito mais.) Por fim, o réu era um pai
de família e não poderia se dar ao luxo de esperar que a vítima cumprisse suas
ameaças de morte. Quem cuidaria de sua família? “Toda ação tem uma reação.” Desfechou
Artur lembrando Newton. E terminou lançando uma tirada genial ao promotor
Márcio, mas que só poderia ser entendida pelos presentes. Nunca diga tudo.
Surpresa! Leitura da sentença com direito ao “Joia”
do prof. Fernando e a cara pelada do Cristiano ao fim!
Veredicto e conclusão: Os jurados endossaram a tese de legítima
defesa putativa da defesa por competitivos 4 votos a 3. Isto é, os jurados absolveram
o réu da acusação de assassinato. Porém o réu foi condenado a 1 ano e 8 meses por
porte ilegal de armas. Eu penso assim, como dizia o Artur, o direito penal é o
mais humano de todos os direitos e o advogado de defesa criminalista é o
advogado mais próximo de Deus. Quando todos pré-julgam, condenam e crucificam,
ele perdoa, compreende e defende. Não é nobre? Eu penso assim, nosso júri foi
uma celebração do Direito. Se não me
falha a memória eu também tinha prometido uma vitória esmagadora da defesa. Enfim,
a justiça foi feita. Vencemos. Todos venceram. A experiência enriqueceu-nos. Quanto a promessa
feita pelo Márcio ao Artur de que abandonaria a faculdade de direito se
perdesse esse júri, bem, nós imploramos para que ele reconsiderasse. Afinal,
ele já faz parte da família. “Se é para o bem de todos e felicidade geral da
nação, diga ao povo que fico.” E ficou. Um beijo do observador.
Por: Thiago
Castilho
Sensacional! Deu pra sentir o calor dos argumentos... Abraços. Lilian.
ResponderExcluirObrigado, Li. Imagino que os juris simulados da Newton Paiva sejam sensacionais.
ResponderExcluirUm beijo do observador.
Adorei a leitura! Um julgamento é sempre uma aula sobre o comportamento humano, seja de que lado for.
ResponderExcluirabç
Sim. Ontem vi o filme "Flores do Oriente". Fiquei chocado com a violência dos japoneses. Tudo tem dois lados. Somos (a humanidade)muito complicados. Eu já não tenho preconceitos. O que vier para o bem, seja bem-vindo, porque o mal é natural.
ResponderExcluirUm beijo do observador.
Show a sua apresentação...
ResponderExcluirNo geral acho que o juri vai muito alem dos fatos e letra fria da lei... é um momento onde a personalidade, o carisma, o charme, a encenação feita pelos promotores e advogados pode mudar o destino... não basta conhecer a lei, tem que saber "interpreta-la" no sentido mais teatral da palavra... admiro quem tem essa capacidade e presença de espirito.
JOPZ
Obrigado, Jopz. Nosso júri foi eletrizante do princípio ao fim. De fato a personalidade e o carisma são a chave para comover e conquistar o júri. Eu acho que o principal é fazer-lhe pensar que o que estão decidindo é o certo. É preciso libertar ou aprisionar a consciencia dos jurados. Por exemplo: se eu fosse a acusação diria que tudo que a defesa tenha dito não passava de "sentimentalismo barato". O réu cometeu "vingança" e não legitima defesa porra nenhuma e portando deveria ser condenado sem dó nem piedade. rss
ResponderExcluirUm abraço do observador.
Cata, deu uma saudade da turma aí. Brilhante trabalho de vcs e o professor Fernando aí é fera e mu instrutor no Núcleo de Prática Jurídica da Unileste em Fabriciano. Peça rara e muito competente. Um abraço à turma, e mui especialmente um parabéns ao brilhante Dr. João Aureliano. A ecolha da Drª Priscila seria um acerto formidável, afinal é peça rara. Quase consegui acompanhar audiencia dela na esfera cível, para relatório de estágio, mas não deu. Hélio Cimini e Gustavo Lana dispensam comentários e o Leandro Valadares e competentíssimo e acima de tudo humilde. A escolha fica muito difícil!!! Parabéns aos meu amigos nos primeiros passos à carreira jurídica.
ResponderExcluirEssa turma é a melhor de todos os tempos. Obrigado Edim, só faltou voce mesmo na nossa trincheira. Aquele abraço.
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